Druam

Druam tende a ser uma experiência "ficcional" em devir, escrita por Nelson Job, pesquisador transdisciplinar, autor do "Livro na Borogodança", do romance "Druam", entre outros. Site: www.nelsonjob.com.br

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1.1.12

Fênixopéia ou: Morrer a Cada Momento




“Come on take a walk on the wild side
Let me kiss you hard in the pouring rain
You like your girls insane
Choose your last words
This is the last time
Cause you and I
We were born to die”
Lana del Rey, “Born to die

Gozamos. Trocamos confidências. E me virei.

Ele me apalpa, tentando entender porque me virei, “Tá com sono?”. Suas mãos em meu dorso.  É bom, mas quando passa pelo meu seio, me sinto invadida, e quase uso esse sentimento pra me fechar ainda mais. Sinto tesão também, é verdade, mas a exaustão do orgasmo recente me permite relevar, reprimir. As mãos, depois de, levemente, passar pela minha bunda, descansam em meus ombros, aí tudo bem.

Eles nunca entendem, nem os mais intuitivos. Me viro porque não suporto o meu amor, a minha entrega. Me viro porque quero me resguardar em mim, quando é possível. Me viro porque é um Ato de Resistência.

As mãos agora me fazem carícias no cabelo. Fecho os olhos, aquilo beira o insuportável. Cada filigrana do meu ser me pede pra me virar e beijá-lo, mas permaneço insondável, fico triste, me sentindo a mercê dos afetos.  É quando uma lágrima escorre, percorrendo meu rosto em uma denúncia tênue de minha condição. Permaneço ali então, chicobuarquiana: melancólica, querendo ser mal-amada pra permanecer nessa condição e, de preferência, que apareça um homem bruto pra me fazer gozar e esquecer e ser esquecida. Gostaria, talvez de estar meio Rita Lee, mas o risco é uma suposta independência, mas dependente do marido que não abandona mais, pois tem medo que a nação o acuse de matá-la indiretamente em função do abandono. Deixo então os ícones nacionais e ameaço de me resguardar na Penélope Cruz, linda, talentosa, amável e amada... e pelo Javier! É Amy que deu certo?!!!

“Tá chorando???” Preferiria, ao menos por hoje, que ele fosse menos perspicaz. Tento lembrar dos momentos em que ele foi grosso, indelicado, quando não me compreendia, por mais que eu suplicasse. Mas esses momentos não bastam pra que eu me conectasse totalmente à minha linhagem imaginária das bruxas queimadas por exercerem plenamente sua feminilidade em êxtase com a Natureza. O Homem converteu essa beleza em histeria, onde até as madres superioras são “inferioras” ao Padre Todo Poderoso. Mas tô sendo cruel com ele tentando ligá-lo ao Homem. Meu ex-marido, sim, eu poderia ligá-lo. Nossa relação foi se degenerando tanto que ele se tornou rapidamente o que muitos dos maridos que eu conheço são (ai, agora eu posso falar!): um escudo com vibrador, sendo que o primeiro é muito mais importante que o segundo. Até porque eu tinha outro, né? Outro que eu podia amar louca e efemeramente porque tinha o “escudo” pra me proteger dos cacos da vida depois. Espero não ser mais tão... (eu tenho que parar de me maldizer...)

Ele enxuga a minha lágrima com ternura. E ainda faz um carinho no meu rosto. Posso ficar aqui, simulando memórias que justifiquem minha imobilidade, ou posso virar pro lado dele, olhar em seus olhos e, se olhos deles estiverem tão ternos como eu imagino, sucumbir àqueles sentimentos. Minhas vísceras se debatem entre medo e risco, sou todas as mulheres do mundo agora: dores, alegrias, desejos, sonhos, angústias...

Sinto a respiração dele, ficando mais tensa. Ou me viro e continuo o que quer que tenha que continuar, ou ele desiste e, quem sabe, dorme. Se me imobilizo, me uno à todas as ressentidas, que muitas vezes não ousaram pisar em um terreno que ambos, homem e mulher, não conhecem. Claro, tudo pode - e tem grandes chances de mais cedo ou mais tarde - dar errado.

Então eu respiro, me amo um pouquinho e faço uma prece ao Feminino, pedindo que me ajude, me proteja, me seja. Me disponho a morrer agora, de não ser mais Eu, de ser Outra Coisa, que os tesões e amores insandecidos possam me conduzir. As fluxões do mundo me permitem a morrer a cada momento; e eu, Fênix.

E aí me viro...

3 comentários:

RESEDÁ disse...

Não dá para ser "EU" quando no AMOR me entrego. Não há proteção para qualquer estado do SER, embora SENDO é como posso IR e assim é como se dá a entrega e também a perda.
Encontro-me perdida ao atravessar tão desejada(?) morte! E ao acordar-"me" deste mergulho volto-"me" para o horizonte a revelar-me outra.
SURPRESA, MISTÉRIO, MAGIA?
Quem ousa buscar ME no antes pode me/se assustar na ausência...na presença do vazio!
Fênix? Talvez...
Nada vai dar certo e nada vai dar errado porque não há maneira de Me resguardar para tal.
bjos queridá

Nelson Job disse...

Fenixei-me em teu comentário!

Lua disse...

Raio fulminante na tensão pré-fluxo/contrafluxo, onda vortexiana... tubo-espuma
Lúciabia